NOTA DE REPÚDIO DO MIEIB AO DECRETO N.º 10.502/2020 – INSTITUI A
POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO ESPECIAL: EQUITATIVA,
INCLUSIVA E COM APRENDIZADO AO LONGO DA VIDA
Brasília, 02 de outubro de 2020
O Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil (MIEIB) vem a público
manifestar repúdio ao Decreto 10.502, de 30 de setembro de 2020, assinado pelo governo Bolsonaro, que instituiu a Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao Longo da Vida, pelas seguintes razões:
1. O governo federal, mais uma vez, desrespeitou os processos legítimos de participação e não ouviu as vozes coletivas (movimentos sociais organizados, conselhos de participação, entidades de pesquisa, Universidades públicas e Institutos Federais de Educação, especialistas, sindicatos, professoras e professores e familiares) contrários à reformulação da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva.
2. O referido Decreto apresenta um conjunto de conceitos retrógrados e que em nada estão alinhados ao paradigma da educação inclusiva, que é fundamentada pelos princípios de uma sociedade democrática, com justiça social, cujos direitos fundamentais são garantidos para todas as pessoas, sem preconceito de qualquer ordem, seja em razão de deficiência, raça, etnia, gênero, sexualidade ou classe social.
3. Na perspectiva da educação inclusiva, a educação especial passou a integrar as propostas pedagógicas das escolas comuns regulares, numa dimensão de transversalidade, desde a educação infantil até o ensino superior, realizando o atendimento educacional especializado, com o objetivo de eliminar barreiras e garantir a plena participação dos bebês, crianças e demais estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/ superdotação, de caráter complementar ou suplementar e não substitutivo. Contudo, o Decreto do governo Bolsonaro tenta distorcer a concepção de educação inclusiva e reduz a educação especial e o atendimento educacional especializado à lógica da segregação em Instituições especializadas.
4. O texto do Poder Executivo está em desalinho com a concepção de deficiência expressa no Decreto 6.949/2009, tal como com a Lei Brasileira de Inclusão – Lei nº 13.146/2015 – documentos esses que trazem à tona o conceito de barreira, compreendido como qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento da ordem do contexto social e que impeça a plena participação das pessoas com deficiência na sociedade. Ao apresentar as escolas especializadas como lócus para “[…] o atendimento de educandos que não se beneficiam em seu desenvolvimento, quando incluídos em escolas regulares e que apresentam demanda por apoios múltiplos e contínuos” (BRASIL, 2020), o Decreto deposita nos sujeitos as causas do fracasso escolar e não nos processos excludentes de escolarização que fundamentam as concepções de educação fortalecidas pelas políticas públicas conservadoras em curso no país.
5. O Decreto deixa sob a responsabilização das famílias as escolhas do local de matrícula de suas filhas e seus filhos. Ao assumir essa estratégia, demonstra total desresponsabilização pela qualidade educacional ofertada no âmbito das escolas comuns regulares como direito de toda a população. Demonstra seu alinhamento com os princípios neoliberais da individualização do direito à educação e com o conservadorismo retrógrado de segregação da educação de bebês, crianças e demais estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento a altas habilidades/superdotação. O direito à educação, na perspectiva da educação inclusiva, pelo atual Decreto, deixa de ser um direito social em sua dimensão coletiva e passa a ser incorporado a partir de uma perspectiva individualista, ao ser assumido pelas Instituições assistenciais de filantropia, um verdadeiro retrocesso na história de luta dos movimentos sociais engajados com os direitos humanos, com a democracia e com a educação pública, laica, gratuita, inclusiva e de qualidade social para todas e todos.
6. O documento apresenta um conceito inapropriado de “aprendizado ao longo da vida” que serve apenas para justificar a oferta de serviços segregados e informais destinados aos adultos com deficiência em instituições especializadas de período ininterrupto, de forma contrária às dimensões do direito à educação – acesso, permanência e qualidade – sem o engajamento do poder público para a implementação de políticas públicas pautadas na participação, autonomia, independência e inclusão social das pessoas com deficiência.
7. O Decreto publicado pelo governo federal não pode, em hipótese alguma, ser analisado sem considerarmos outras políticas públicas e medidas em curso no país. Dentre elas, destacamos: a vigência da EC nº 95/2020 que impôs teto para o investimento em políticas sociais; a aprovação da Resolução CNE/CP n.º 02/2019 que instituiu as Novas Diretrizes Nacionais para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica e institui a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica (BNC – Formação) e do Parecer CNE/CP n.º 14/2020, que define Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Continuada de Professores da Educação Básica e Base Nacional Comum para a Formação Continuada de Professores da Educação Básica (BNC-Formação Continuada), pautadas por uma dimensão tecnicista e fragmentada de formação docente e que nada se alinham aos princípios da educação inclusiva; a omissão do governo federal na proteção de direitos fundamentais durante a Pandemia da Covid-19; dentre outras medidas que impendem a garantia de direitos sociais conquistados historicamente.
8. O documento publicado amplia a cisão entre a escola comum regular e o
atendimento educacional especializado, utilizando da ampliação de acesso à
classe e/ou escola especial para justificar o conceito da equidade. Assim, fere o Direito Humano à Educação Especial na perspectiva inclusiva.
O MIEB, comprometido com o direito à vida, à democracia e educação dos bebês e crianças na educação infantil, manifesta-se com imensa indignação à publicação do Decreto 10.502/2020 e classifica essa medida como retrocesso histórico das políticas de inclusão das pessoas com deficiência no país.
O nosso movimento sempre se posicionará em defesa de uma educação infantil
pública, democrática, gratuita, laica, inclusiva, não capacitista, antirracista e não sexista para todos os bebês e crianças no Brasil.
Continuaremos na luta!
Somos fortes, somos MIEIB!
COMITÊ DIRETIVO DO MIEIB 2018-2020 TITULARES
Norte Nordeste Centro-Oeste Sudeste Sul
Ana Alice Monteiro dos Santos – RR
Célia Maria Vieira dos Santos –PE
Maria Aparecida Camarano Martins – DF
Fernanda Cristina de Souza SP
Soeli Terezinha Pereira – PR
SUPLENTES
Francisca Serrão – RO
Rose Bonfim – BA
Cléria Franco – MT
Sandro Vinícius dos Santos MG
Ariete Brusius – RS