por Luís Paulo Petersen Andreazza
sobre o autor do post: Advogado, graduado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS. Especializando em Direito Público pela Escola Superior da Magistratura Federal – ESMAFE/RS.
A Resolução CNE/CEB nº 01 de 14.01.2010, editada pela Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, impôs o corte etário para o ingresso dos educandos na série inicial do Ensino Fundamental, mas gerou uma série de questionamentos quanto a sua aplicação em casos específicos.
A aplicação desta Resolução, a qual foi recepcionada no ano de 2010, permitiu ainda naquele ano a matrícula no Ensino Fundamental de crianças que completassem 06 (seis) anos durante o ano letivo ou que haviam cursado dois anos de Pré-Escola. Cumpre referir que, a partir da publicação desta Resolução, a referida regra foi estendida para o ano de 2011.
Diante da aplicação desta regra e de sua excepcionalidade, restou configurado o caráter de transitoriedade que levou à sua extensão até o ano de 2011, a fim de evitar a interrupção do ensino e uma possível frustração na vida estudantil dos estudantes, bem como evitar o retrocesso estudantil dos educandos que já haviam freqüentado a Pré-Escola pelo período de dois anos.
Entretanto, a fixação deste requisito para a matrícula dos alunos que estão aptos a iniciar os estudos no Ensino Fundamental gera divergências quanto a sua constitucionalidade, uma vez que não alcança casos específicos que merecem ser analisados à luz do princípio da proporcionalidade, razoabilidade e, inclusive, da isonomia.
Ocorre que, por um lado, o corte etário foi introduzido para que seja inibida a escolarização precoce das crianças, permitindo, assim, um alinhamento dos sistemas de ensino. Ademais, o corte etário também visa que seja assegurada a continuidade e a especificidade de cada etapa da educação básica. Ora, diante deste objetivo, o corte etário surge com um propósito positivo, uma vez que foi estabelecido através de análises sobre as adaptações e aptidões dos educandos a partir dos 6 (seis) anos de idade.
Todavia, em casos específicos se suscitam dúvidas quanto a aplicação do corte etário, uma vez que a própria Constituição Federal dá margem para questionamentos sobre a constitucionalidade da Resolução do Conselho Nacional de Educação.
Neste sentido, nos casos em que o educando completaria 06 (seis) anos de idade poucos dias ou meses após a data fixada, 31 de março de cada ano letivo, pode, assim, ser configurada a violação do direito social à educação no ensino fundamental e o iminente prejuízo do menor.
Cumpre destacar que a partir da aplicação do corte etário no ano de 2012 e nos anos subsequentes, esta regra sujeitaria o menor, aquele que completaria 6 (seis) anos logo após a data fixada pelo corte etário, a um manifesto prejuízo. Dessa forma, este educando seria prejudicado, em razão do impedimento na continuidade do ensino básico, causando, assim, um dano à progressão do seu processo de alfabetização e caracterizando uma afronta ao princípio da isonomia.
Por outro lado, temos que seria incompreensível que o direito à educação, assegurado constitucionalmente, seja prevalecido por legislação de menor alcance na hierarquia das normas, isto é, que resoluções instituam critérios prejudiciais à educação do menor em casos específicos, por exemplo, os casos de crianças que alcançam a idade exigida após a data estabelecida no corte etário.
Importante referir que o Estado tem o dever de garantir o acesso aos níveis mais elevados de ensino, segundo a capacidade de cada cidadão, por força do artigo 208, V, da Constituição Federal. No entanto, o critério utilizado para a garantia do acesso à educação encontra-se insculpido na capacidade de cada estudante, é dizer, está em desacordo com o nosso texto constitucional, o qual não contempla critério restritivo em relação à idade.
No que tange a norma infraconstitucional, a Lei nº 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB), que rege o sistema educacional nacional, estabelece o ensino fundamental obrigatório com início a partir dos 6 (seis) anos de idade sem referência ao corte etário instituído pela Resolução do Conselho Nacional de Educação.
Assim, é incabível o critério burocrático instituído pela Resolução do CNE, pois acarreta um impedimento para o acesso do educando ao ensino fundamental, uma vez que a norma contida na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional deve ser interpretada de acordo com o texto constitucional, o qual não possui qualquer critério restritivo relativo à idade do educando.
Por sua vez, ainda que o Conselho Nacional de Educação institua o critério de corte etário para o ingresso no ensino fundamental, a fim de evitar discrepância de níveis de intelectualidade nas turmas escolares, a capacidade de aprendizagem de cada educando deve ser avaliada de forma individual, inclusive daqueles que são excluídos deste nivelamento por poucos dias ou meses. Neste sentido, a avaliação para ingresso no ensino fundamental deve ser analisada em um sentido estrito, pois a aferição da capacidade de aprendizagem pelo critério etário pode trazer prejuízos ao educando que deixa de se inserir no ensino fundamental por uma diferença de poucos meses.
Portanto, o debate ora trazido tem o objeto de elucidar os fundamentos que leva ao educando, que completaria 06 (seis) anos de idade logo após a data do corte etário, a ter o seu acesso ao Ensino Fundamental impossibilitado. Dessa forma, uma criança que não poderia ser incluída no corte etário, por poucos dias ou meses além da data fixada, deveria ser submetida a uma avaliação das suas condições para a inclusão no Ensino Fundamental, ainda que essa regra imposta tenha o objetivo de alcançar uma padronização do sistema de ensino nacional.
Sobre as avaliações para ingresso no Ensino Fundamental (1º ano) não há uma contradição com a própria LDB ?
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação, aliás, veda qualquer forma de classificação subjetiva ou de avaliação dos ingressantes ao primeiro ano do ensino
fundamental:
Art.24 – A educação básica, nos níveis fundamental e médio, será organizada de acordo com as seguintes regras comuns:
(…) II – A classificação em qualquer série ou etapa, exceto a
primeira do ensino fundamental, pode ser feita:
Por promoção (…);
Por transferência (…);
Independentemente de escolarização anterior, mediante avaliação feita pela escola, que defina o grau de desenvolvimento e experiência do candidato e permita sua inscrição na série ou etapa adequada, conforme regulamentação do respectivo sistema de ensino.
Poderia elucidar essa dúvida ?
Olá Mathias,
De fato há um problema aí porque não se pode , em função da LDB, avaliar o aluno no 1o ano e reclassificá-lo, por exemplo, para o 2o ano.
Então, se o aluno cognitivamente estiver apto a ingressar no 2o ano não poderá seguir adiante, porque não poderá ser reclassificado no 1o ano segundo a LDB.
É isso mesmo, você está correto em considerar uma contradição.
Abraços
Cara,Sônia, seria possível entrar com mandado de segurança contra escola p matricula datacorte fazer esse pedido sem um advogado ou e impossível?
Olá Roberta, é impossível. O mandado de segurança é uma ação feita na Justiça e é preciso constituir advogado ou buscar auxílio gratuito junto a Defensoria Pública. Sem advogado não conseguimos mover nenhuma ação, infelizmente.
Abraços